sábado, outubro 22, 2011

56 - alma de madalena

Enquanto lá fora se faziam sentir as primeiras rajadas de vento da noite, Madalena, no interior do seu quarto deixava-se embevecer com fotografias antigas. Mergulhada em tempos antigos, sorria com a felicidade que outrora tivera. Inevitavelmente, imagina-se de novo criança e sente todo o amor que a envolvia. Dentro de si é invadida por um misto de tristeza por ter crescido e a revolta desse amor se ter perdido. Os afectos, os mimos, os sorrisos, os abraços... ficaram lá longe, esquecidos. Hoje, Madalena, é simplesmente a sombra daquilo que fora. O olhar doce e o sorriso de menina mantêm-se. A sua ingenuidade fá-la crer que ainda é possível construir e ter o que deseja: ser verdadeiramente amada. Sentir-se insubstituível e importante na vida de alguém é algo que já não sente há muito. O que mudou? Ela não sabe… ou teme saber. Talvez ter a consciência de que viveu uma ilusão seja mais doloroso do que saber que tudo o que teve de bom se tenha perdido. Essa inconstância dentro de si, essa insegurança e essa sensação de falta de amor é algo que a corrói de uma forma monstruosa, que só ela é capaz de sentir. Alegre e destemida, passa segurança e confiança para todos aqueles que não a têm..., mas no seu mundo interior a infinidade de questões impede-a de encontrar a paz que tanto procura. Ela conhece-se tão bem e é esse conhecimento que a sufoca. Quer diferenciar-se dos outros, não quer ser mais uma, não quer viver por viver. Quer marcar a diferença; quer ser gente! Não quer ser o que muitos são, uma máquina. Prefere chorar, perder-se em gargalhadas, sorrir, amar, gritar, mesmo que em silêncio, do que deixar de sentir. Talvez um dia aprenda o significado de família, talvez um dia possa saber o que isso é. Mas, enquanto isso não acontece, a alma de Madalena, com as suas nódoas negras, tenta abraçar novos caracteres, novos seres, novas gente. Talvez, assim, encontre quem lhe dê valor e, principalmente, talvez assim, encontre quem a queira proteger com o seu amor eterno. Talvez...