terça-feira, fevereiro 02, 2010

45 - A voz

A voz suave que me percorre o corpo, que me abraça e me conforta. A voz com que sonho, com que desejo, com que vivo. A voz que eu oiço, que só eu oiço, à espera de um dia ter a força para, num simples murmuro, poder ser ouvida, escutada. A voz que, por tantas vezes, foi obrigada a se calar. Ah, esta voz... é menina, de pés descalços e rouca, rouca de gritar para um povo que não a quer ouvir, que finge não existir. Um povo que não se digna a Viver, apenas se limita a existir. A voz insiste e existe!, mas esta gente teima em fingir que nada acontece, que nada importa, que nada interessa, que nada revolta! Ah, como esta gente é louca, louca por se deixar envolver numa realidade que não existe; louca por se deixar conformar e mergulhar num fundo onde a lágrima e o rosto de sufoco daquela pequena criança, não é capaz de transparecer. Depois choro, como se o meu choro pudesse calar a voz que insiste, que persiste, que luta e não desiste. Quase que morro de angustia ao ver a inércia deste povo. Ah, que povo, que ausência de carácter, que ausência de humanismo. Ah, como isto me sufoca, me entristece, me revolta. Delicadamente, aos poucos, eu darei forma a esta voz e, esperando que não seja tarde de mais, ela vai ser ouvida e envergonhará cada um que se deixou conformar com um mundo politicamente correcto, mas sem escrúpulos.

Um dia, irei ver esta voz que, embora rouca, transpirará o brilho de ter conseguido; de ter transformado ausência em presença, inércia em acção e a lágrima só será permitida quando o sorriso não for suficiente para expressar o mais bonito dos sentimentos.